Sei que a palavra foi o maior instrumento de Lula para a construção de sua trajetória. E que por saber usá-la, as portas se lhe abriram para que se tornasse o político mais bem-sucedido da história política do Brasil, o único a se eleger três vezes presidente.
Mas sei também que o tempo passa, a lusitana roda, e o que ontem só fez bem, hoje, em excesso, pode fazer mal. Tarefas que no passado eu tirava de letra, agora já me cansam. Antes, emitia juízos de valor sem clemência; hoje, procuro ser mais prudente.
Lula segue encantado com a própria voz e com a disposição de, se possível, estar em toda parte ao mesmo tempo, apesar das dores no quadril que o incomodam. Como se fosse onisciente. Cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém.
Outro dia, Lula defendeu que os votos dos ministros de tribunais superiores deveriam ser sigilosos. O resultado dos julgamentos seria anunciado, mas como votou cada ministro, não. É assim na mais alta Corte de justiça americana, porque não aqui?
Nem tudo que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil, Lula sabe. Não faz mal saber como votou cada ministro e assistir aos debates que travam. Transparência faz bem à democracia, tanto mais num país onde a democracia ainda capenga.
Anteontem, Lula disse na Índia que se Vladimir Putin, presidente da Rússia, visitar o Brasil não será preso. Ocorre que contra Putin, por conta da invasão à Ucrânia, há uma ordem de prisão emitida pelo Tribunal Penal Internacional.
Lula desdenhou do tribunal, do qual o Brasil é signatário:
“Qual é a grandeza que fez o Brasil tomar essa decisão de ser signatário? Os países do Conselho de Segurança da ONU não são signatários, só os bagrinhos assinam.”
Nos últimos anos, Lula e o PT manifestaram-se favoravelmente ao Tribunal Penal Internacional ao defender que a corte julgue Bolsonaro por crimes contra a humanidade cometidos durante a pandemia da Covid-19. Deve ter esquecido.
Em abril último, ao visitar a Espanha, Lula disse que Bolsonaro, “um dia, será julgado em tribunal internacional pela atuação na pandemia”. O Tribunal Penal Internacional é o único em que uma pessoa física pode ser julgada por crimes contra a humanidade.
Devagar com o andor porque o santo não é de ferro.