As Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) e as Comissões Parlamentares Mista de Inquérito (CPMI) têm poderes de investigação idênticos aos conferidos às autoridades judiciais.
Isso garante aos depoentes que comparecerem no Legislativo as garantias iguais se estivessem sob a presença de uma autoridade policial ou um juiz.
VÍDEO – CPMI do 8/1: ex-comandante da PM do DF não faz juramento de dizer a verdade
Permanecer calado, é um desses direitos previstos no artigo 5º, inciso 63, da Constituição Federal. O direito ao silêncio para não produzir provas contra si também consta no artigo 186 do CPP (Código de Processo Penal). Sendo que, durante a chamada fase de qualificação, o depoente não pode recorrer ao direito de ficar calado.
Essa fase é quando o mesmo deve se apresentar aos parlamentares (ou em casos judiciais), dizendo seu nome, e seus dados pessoais.
Parágrafo único do artigo 186 da Constituição diz que “o silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa”.
Testemunha e investigado
O ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) Fábio Augusto Vieira usou do habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para ficar em silêncio durante depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) na última terça-feira (29).
O texto garantiu ao depoente o direito ao silêncio e o direito de não ser submetido ao compromisso de dizer a verdade. Nos depoimentos anteriores da CPMI, o convocado só não precisava responder a perguntas que o incriminasse.
Leia Mais
Waack: O consenso entre o governo e as Forças Armadas
Com depoimentos simultâneos no caso das joias, PF pede apoio para PM reforçar segurança do prédio
CPMI procura hacker Walter Delgatti para propor delação premiada
Isso porque, há uma diferença entre a pessoa que se apresenta como testemunha ou investigado. É o que explica o advogado e pesquisador em direito constitucional, Lucas Sousa Gomes.
Em caso de testemunha, esta está comprometida com a veracidade dos fatos, ao contrário do investigado, que não está coberto sob a obrigação com a realidade.
“É preciso deixar claro o papel de cada indivíduo dentro de um processo judicial ou em eventual atendimento de requisição por parte de alguma CPMI. Entretanto, as testemunhas prestam um compromisso com a verdade, com o dever de responder de forma clara e objetiva as perguntas e questionamentos para que os fatos sejam esclarecidos. É possível encontrar decisões judiciais que visam resguardar o direito ao silêncio por parte da testemunha quando a pergunta causa prejuízo a si”, afirma o constitucionalista.
Limite para silêncio
A CPMI do 8 de janeiro chegou a acionar a Justiça do Distrito Federal contra o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), por ficar em silêncio durante seu depoimento em julho de 2023.
Em nota, o deputado e presidente da CPI do 8 de Janeiro, Arthur Maia (União Brasil-BA), disse que Cid “abusou ostensivamente” do direito ao silêncio. A Comissão alega que ficou configurado no caso o crime de impedir ou tentar impedir o regular funcionamento de CPI.
A lei que trata do funcionamento de CPI prevê pena de 2 a 4 anos de prisão para quem fizer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha à comissão. O advogado diz que Mauro Cid foi convocado na condição de testemunha, não de investigado.
Segundo Gomes, a discussão nesse momento é justamente a interpretação que deve prevalecer a respeito da decisão da ministra Cármen Lúcia. “Do ponto de vista jurídico e regimental, ele tinha o dever de responder os questionamentos, com exceção de eventuais perguntas que pudessem prejudicá-lo. Entretanto, resguardado por decisão da Suprema Corte, Mauro Cid optou pelo direito ao silêncio. Todas as perguntas que foram feitas prejudicavam Mauro Cid? Qual a amplitude da decisão da Ministra? São esses elementos que a CPI gostaria de esclarecer”, afirma.
Direito de silêncio parcial
O depoente também goza do direito de responder apenas às perguntas de seu interesse, ou da defesa. Isso significa, que o convidado das CPIs ou CPMIs faz jus ao direito do silêncio seletivo.
Exemplo desta manobra que a defesa do depoente pode usar, é o caso do hacker Walter Delgatti que permaneceu em silêncio ao ser questionado pela oposição durante a CPMI do 8 de Janeiro, na quinta-feira (17).
Delgatti decidiu utilizar o direito ao silêncio, concedido pelo Supremo STF, durante a segunda etapa de seu depoimento, no início da tarde, a partir dos questionamentos feitos pelos senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Marcos Rogério (PR-RO) e pelo deputado Delegado Ramagem (PL-RJ).
O advogado Sousa Gomes reitera que a CPI conclui explicando que as Comissões não podem depender apenas do discurso dos depoentes que são convocados. De forma que, os parlamentares têm o direito de utilizar outras manobras que ajude, na investigação.
“A CPMI não pode amparar todo o seu trabalho e desenvolvimento apenas no depoimento dos convocados. Vale ressaltar que ela dispõe de outros métodos para esclarecer os fatos. Por exemplo, conforme jurisprudência pacífica, a CPMI pode solicitar documentos de outros órgãos. Essas requisições documentais têm sido bastante utilizadas na atual CPMI dos atos antidemocráticos e também foi muito utilizada na CPMI da Pandemia”, conclui.
Este conteúdo foi originalmente publicado em Depoentes poderão ficar calados na CPMI? Entenda o direito ao silêncio no site CNN Brasil.