Ora dê, se fizer favor, uma vista de olhos neste estudo do Policy Institute do King’s College London sobre as atitudes em 24 países para com a educação das crianças.
Em 1998, 50% dos inquiridos do Reino Unido acharam que a obediência era um dos valores importantes a ensinar às crianças. Em 2022, essa percentagem desce para 11%.
Não foi só no Reino Unido. No conjunto dos países sondados – que são muitos –, a obediência estava em 5.º lugar e passou agora para 10.º.
Portugal não consta, mas note-se que a obediência na Espanha ainda obtém 41% dos votos – e 43% no Brasil. Mais do que isso, só no Egipto (56), no México (57) e na Nigéria (58).
Folgo muito em saber que a obediência está em queda livre. Quando eu era criança, a obediência ainda era a obsessão principal.
Para nós, crianças, por conseguinte, a obsessão principal era a desobediência. Até hoje, é a palavra que mais me ocorre quando quero elogiar alguém. Para mim, a desobediência equivale à liberdade, à coragem, à independência, à originalidade e à imaginação, ao hedonismo e ao espírito artístico.
Até nisso os nossos pais e professores mandam em nós: mandam-nos adorar o sol – nós adoramos a lua. Mandam-nos ir logo para casa – e nós fazemos tudo para não ir logo para casa, mesmo quando é isso que nos apetece.
Tanto o movimento hippy nos anos 60 como o punk nos anos 70 foram revoltas contra a obediência. Ainda é revoltante pensar em toda a gente que morreu no Vietname: valeu mesmo a pena, não valeu, mandar tantos jovens para o Vietname?
O lema dos hippies era “do your own thing” (faz o que a tua alma te pede), mas o que dizia realmente era “recusa-te a fazer aquilo que os mais velhos querem que tu faças”.
O punk disse a mesma coisa, mas de forma niilista: nem é preciso fazer nada, manda tudo à merda. Desobedecer chega perfeitamente.
Os hippies e os punks estão de parabéns: conseguiram ferir de morte o culto sinistro e interesseiro da obediência.
(Transcrito do PÚBLICO)