São Paulo – A Secretaria da Segurança Pública paulista (SSP) já pagou R$ 14,9 milhões à empresa israelense Cognyte para que as polícias Civil e Militar usem o software espião capaz de monitorar celulares. O Metrópoles apurou que a tecnologia está ativa até hoje em São Paulo.
O programa israelense FirstMile foi o pivô da Operação Última Milha, deflagrada pela Polícia Federal (PF) na sexta-feira (20/10). Segundo a investigação, servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) usaram o software para espionar políticos, jornalistas e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), durante o governo Jair Bolsonaro (PL).
Em São Paulo, o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro de Bolsonaro, contratou neste ano, sem licitação, os serviços da Cognyte para a Diretoria de Tecnologia da Informação e Comunicação, da Polícia Militar (PM). O pagamento de R$ 8,98 milhões foi realizado em julho.
Segundo despacho publicado pela PM em março no Diário Oficial, o objeto da contratação foi a “aquisição de Sistema de Radiofrequência Portátil à Polícia Militar” e não foi aberta licitação para avaliar a melhor proposta porque o produto contratado é exclusivo da empresa israelense.
Já a nota de empenho disponível no site da Secretaria da Fazenda paulista mostra que o contrato da PM com a Cognyte é referente à “ferramenta GI-2S” – aparelho tático que monitora os passos de até 10 mil celulares a cada 12 meses, a mesma função do FirstMile.
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A Polícia Federal deflagrou a Operação Última Milha para investigar o uso indevido de sistema de geolocalização de celulares sem autorização da Justiça por servidores da Abin
Hugo Barreto/Metrópoles
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Apreensão de US$ 171.800,00 em espécie na residência de um dos alvos de busca e apreensão e afastamento da função pública, em Brasília/DF
PF/Divulgação
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Policiais cumprem dois mandados de prisão e 25 de busca e apreensão, além de medidas cautelares diversas da prisão, expedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF), nos estados de São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Goiás e no Distrito Federal
Hugo Barreto/Metrópoles
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De acordo com as investigações, o sistema de geolocalização usado pela Abin é um software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira
Hugo Barreto/Metrópoles
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A rede de telefonia teria sido invadida diversas vezes, com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos.
Hugo Barreto/Metrópoles
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foto colorida da fachada da Abin
Agência Brasileira de Inteligência (Abin)
Hugo Barreto/Metrópoles
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Entre os alvos que teriam sido monitorados, estão jornalistas, políticos e adversários da gestão de Jair Bolsonaro (PL)
Hugo Barreto/Metrópoles
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Viatura chega à sede da Polícia Federal durante a operação Última Milha. Deflagrada na manhã desta sexta-feira, a operação investiga o monitoramento ilegal de celulares pela Agência Brasileira de Inteligência(Abin)
Breno Esaki/Metrópoles @BrenoEsakiFoto
Helicóptero chega à PF
Helicóptero pousa na sede da PF
Breno Esaki/Metrópoles
Eduardo Arthur Izycki Abin
Eduardo Arthur Izycki trabalhava como oficial de Inteligência da Abin
Reprodução/Redes sociais
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Rodrigo Colli, profissional da área de Contrainteligência Cibernética da Abin que foi preso
Reprodução
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Sem licitação
Já na Polícia Civil, o uso do software espião é anterior. Em novembro de 2021, ainda na gestão do ex-governador João Doria (ex-PSDB), a corporação publicou no Diário Oficial do estado despacho para dispensar a licitação e adquirir o GI-2S e o FirstMile.
Na publicação, as tecnologias são descritas como “equipamento contendo sistema portátil de identificação, rastreamento e localização de dispositivos móveis celulares em campo”. Por esse contrato, a Cognyte recebeu R$ 5,94 milhões do governo paulista, pagos em fevereiro de 2022.
O despacho também afirma que a tecnologia israelense deveria ser usada pela Divisão Antissequestro (DAS), vinculada ao Departamento de Operações Policiais Estratégicas (Dope), órgão responsável por prender quadrilhas de sequestradores e resgatar vítimas em São Paulo.
O pedido de dispensa de licitação foi feito pelo então diretor do Dope, o delegado Osvaldo Nico Gonçalves, por “inviabilidade de competição” – já que a Cognyte é a única empresa que o oferece o serviço. Hoje, o delegado é o número dois da SSP e ocupa o cargo de secretário-adjunto.
Operação Última Milha
A Operação Última Milha, da PF, cumpriu nessa sexta-feira (20/10) dois mandados de prisão e 25 de busca e apreensão, autorizados pelo STF, nos estados de São Paulo, Paraná, Goiás e Santa Catarina, onde fica a sede da Cognyte no Brasil, além do Distrito Federal.
Segundo a coluna Na Mira, os presos na ação policial são Rodrigo Colli, profissional da área de contrainteligência cibernética da Abin, e o oficial de inteligência Eduardo Arthur Izycki.
A investigação aponta que o sistema de espionagem com geolocalização de celulares da agência foi usado para monitorar 2,2 mil jornalistas, advogados, políticos, alguns ministros do STF e pessoas consideradas adversárias pela gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Para monitorar os celulares, basta que o agente digite o número da pessoa. Além disso, a aplicação cria históricos de deslocamento e alertas em tempo real da movimentação dos aparelhos cadastrados.
Em nota enviada ao Metrópoles, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirma apenas que sistema citado pela reportagem é utilizado pelas forças de segurança do Estado em operações de combate ao crime organizado, sequestros e demais ações em proteção da sociedade.
De acordo com a pasta, não há qualquer irregularidade no uso do software, que foi adquirido de acordo com a Lei 8.666/93, sendo o contrato regulamentado pela Lei 12.850 de combate às organizações criminosas.