Assumindo na ONU o papel de “porta-voz” do chamado Sul Global, o presidente Lula acabou dando um norte para o debate do Clima.
O norte é o foco na desigualdade como objetivo síntese da Agenda das mudanças climáticas. Sem o combate às desigualdades, não haverá combate eficaz aos efeitos negativos das mudanças climáticas.
Nesta direção, é preciso perseguir dois objetivos ao mesmo tempo: desenvolvimento econômico e preservação ambiental. Conciliar os dois objetivos.
A Agenda precisa ser inclusiva e considerar não apenas a realidade dos países desenvolvidos. Significa enfrentar desigualdades históricas. E atribuir responsabilidades diferenciadas. Não se pode, por exemplo, impedir países em desenvolvimento de desenvolver suas reservas de gás natural. Tony Blair diz que “é uma loucura estar numa situação em que tentamos impedir”. Na África, diz ele, a alternativa seria queimar lenha.
Nesta toada, Lula alia-se aos posicionamentos de lideranças globais comoTony Blair. E como o Consenso de Copenhague, uma coalizão internacional de políticos, empresários, intelectuais e ativistas culturais que se unem em torno da Aliança para a Cidadania Responsável (ARC – Alliance for Responsible Citzenship).
Tony Blair esteve no Brasil há poucos dias e conclamou o mundo a combater a polarização do debate (desenvolvimento “versus” meio ambiente). É cirúrgico: “Vamos ter de achar uma maneira para permitir aos países se desenvolverem de forma sustentável”.
Na mesma direção, o Consenso de Copenhague advoga a definição e a escolha de prioridades, sem “tratamento alarmista”. Assim, o Consenso sugere que “precisamos ter uma discussão honesta sobre custos e benefícios para encontrar as melhores soluções”. Começando por medidas para “ajudar de forma mais eficiente a metade mais pobre do mundo”.
Daí vem uma sugestão de ordem de prioridades, identificando na partida as metas ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) mais eficazes. E chega à definição de 11 políticas/metas consideradas mais plausíveis: eliminar a tuberculose; reduzir a fome; fomentar o aprendizado nas escolas; salvar a vida de mães e recém-nascidos; combater a malária; tornar as compras governamentais mais eficientes; melhorar a nutrição; aumentar a segurança fundiária; turbinar os efeitos das relações comerciais; avançar com a migração qualificada; e aumentar as taxas de vacinação infantil.
Feitas as contas pelo Consenso, estas 11 políticas factíveis poderiam “salvar mais de 4 milhões de vidas por ano e gerar benefícios econômicos de mais de US$ 1 trilhão a partir de custos de US$ 35 bilhões anuais durante os próximos sete anos”. Ao mesmo tempo em que se lida com o problema mais imediato das pessoas, se constrói as fundações para o futuro. O futuro, que já começou, significa execução de políticas para zerar a emissão de carbono. Estas políticas custarão mais de US$ 100 trilhões.
Lula conclamou pelo caminho das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. São as populações do Sul Global as mais afetadas pelas perdas e danos causadas pela mudança no clima. Diz ele: “os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase a metade de todo o carbono lançado na atmosfera”.
Tudo somado, defendendo o foco nas desigualdades, a conciliação entre desenvolvimento e meio ambiente e o multilateralismo, o presidente Lula deu um novo norte para a Agenda das mudanças climáticas. Atuando como um “porta-voz” dos países em desenvolvimento.
Tony Blair diz que a conciliação dos dois objetivos (desenvolvimento & clima) pode ser obtida de duas maneiras: a primeira é encontrar os mecanismos financeiros para permitir que a transição energética aconteça; e a segunda é investir nas tecnologias do futuro. Leva tempo.
*Pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science.